sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O Xintoísmo


O Xintoísmo não tem um fundador. Trata-se de uma típica religião nacional que, ao longo dos séculos, tem adoptado tradições de diversas outras religiões. Não possui uma ética ou um credo formulado. A essência do Xintoísmo está no cerimonial e ritual que mantém o contacto com o divino.
É frequente dizer-se que o Xintoísmo possui vário milhões de deuses, Kamis, que se manifestam sob a forma de árvore, montanhas, rios, animais e seres humanos. A palavra japonesa Kami pode também ser traduzida por «espírito». O culto dos espíritos da natureza e dos antepassados tem sido fundamental para o Xintoísmo, desde os tempos em que o Japão era uma sociedade agrária. Este culto dos antepassados difundiu-se particularmente sob a influência do Confucionismo chinês.
Segundo a mitologia japonesa, um casal divino, Izanagi e Izanami, teria descido do céu e dado, primeiro, origem às ilhas japonesas, seguidamente ao resto do mundo e a tudo no seu interior e, finalmente, a uns quantos Kamis. O maior destes Kamis era a deusa do sol, Amaterasu. Os outros Kamis ter-se- iam estabelecido na terra e criado os primeiros seres humanos. Mas a sociedade humana necessitava de ordem e de liderança, pelo que o neto de Amaterasu foi mandado para a terra. Um dos seus descendentes viria a tornar-se o primeiro imperador do Japão.

Em consequência, todos os japoneses têm origem divina, mas em especial o imperador, directamente aparentado com a própria deusa do sol, Amaterasu.

Gradualmente, o culto dos Kamis dos imperadores falecidos foi substituído pela veneração dos próprios imperadores, que eram Kamis vivos.


A origem do culto do imperador é parcialmente explicável pelas condições políticas do século XIX. O Japão estava ameaçado pelo expansionismo ocidental e sentiu, por isso, a necessidade de acentuar seu carácter nacional próprio. Ao mesmo tempo, o imperador tinha sido colocado à margem dos chefes militares, os shoguns, que detinham, na realidade, o poder.

Em 1867, um golpe deu ao imperador Meiji o controlo do país, tendo ele então instigado uma renovação política e religiosa. O Xintoísmo transformou-se na religião do Estado, enquanto foram destruídos templos budistas e erradicados os elementos budistas existentes na cultura xintoístas.


Foram colocadas imagens do imperador em todos os edifícios oficiais, escolas e fábricas, e as pessoas tinham que se curvar respeitosamente perante os retratos.

A par do culto imperial verificou-se um forte nacionalismo que constituiu a base do crescente expansionismo japonês até á Segunda Guerra Mundial, na qual o Japão se aliou à Alemanha.
A religião estava intrinsecamente ligada ao nacionalismo, sendo o Xintoísmo, por exemplo, a autoridade ideológica para os pilotos suicidas japoneses (Kamikaze significa «vento divino»).
Cada soldado morto na guerra era imediatamente transformado num Kami, com uma cerimónia em sua honra a ter lugar nos templos xintoístas.


Depois na derrota do Japão, em Agosto de 1945, o imperador emitiu uma declaração renunciando à sua natureza divina. O Xintoísmo foi abolido como religião de Estado, mas o Xintoísmo popular, que sempre tinha coexistido com o culto do imperador, permaneceu, gozando mesmo de um certo renascimento.


O culto é observado tanto em casa como no templo, dos quais existem cerca de 20 mil. Os templos, que anteriormente eram administrados pelo governo imperial, estão agora organizados em diversas uniões com chefes eleitos.


O templo – morada dos Kamis


Um templo xintoísta não é um lugar de oração, mas sim a morada de um kami, ou o local onde ele é venerado segundo determinados rituais.
No santuário interior do templo existe um objecto que simboliza a proximidade do kami, e é este símbolo que torna o templo um local sagrado. Os três símbolos mais importantes consistem num espelho, numa jóia ornamental e numa espada, guardados em três dos maiores templos xintoístas do Japão. O espelho, a jóia e a espada estão associados a um mito respeitante à deusa do sol, Amaterasu, e ao primeiro imperador do Japão.
De acordo com um dos antigos mitos divinos, um dia Amaterasu escondeu-se numa caverna, aborrecida. Mas foi atraída para o exterior por um espelho e persuadida a brilhar de novo.

O sacerdócio


Originalmente, as cerimónias eram desempenhadas pelo chefe de uma família ou de um clã e, a um nível superior na pirâmide social, por um príncipe ou pelo próprio imperador.
Actualmente, as organizações dos templos nomeiam os sacerdotes a tempo inteiro ou parcial. A maioria é casada, e tem igualmente uma ocupação secular. Desde a guerra que também as mulheres são elegíveis para o sacerdócio.
Os deveres do sacerdote são, principalmente, de carácter ritual: ele tem de saber como executar as cerimónias diárias e como conduzir as grandes festas associadas às festividades.

Os quatro aspectos principais do culto


No Xintoísmo as cerimónias são essenciais. Ajudam a prevenir acidentes, auxiliam a cooperação e o contacto com os Kamis e promovem o contentamento e a paz, para o individuo e para a sociedade.
As cerimonias variam desde as mais simples, celebradas em casa, até às grandes festas anuais do templo, existindo, no entanto, quatro elementos que se repetem em todos os tipos de cerimonia. São eles:


Purificação – o objectivo da purificação é banir tudo o que seja mau ou injusto, qualquer coisa que possa pôr em risco o relacionamento do indivíduo com os Kamis. A impureza está essencialmente associada à doença e à morte, embora todas as outras funções carnais a possam igualmente gerar.
Todo o serviço divino começa com a purificação. Pode ser apenas uma questão de enxaguar a boca e despejar um pouco de água sobre as pontas dos dedos. No templo é levada a cabo pelo sacerdote, que sacode uma vara especial em frente dos indivíduos, ou objectos, a serem purificados. A referida vara de purificação tem, presa a si, umas tiras de papel ou fios de linho, que lhe dão o aspecto duma espécie de vassora.


Sacrifício – se não forem feitas oferendas, o indivíduo poderá perder contacto com os Kamis e sofrer um revés. A oferta pode assumir a forma de dinheiro, de comida ou de bebida. As actividades artísticas ou desportivas ligadas às festividades do templo têm também importância religiosa e deveriam ser encaradas como um género de sacrifício. A dança, o teatro, a luta e o tiro ao arco são todos executados em honra dos deuses.


Oração – uma oração começa geralmente com um elogio ao Kami a quem é dirigida, e com uma expressão de gratidão pela beneficência. Depois, as ofertas são especificadas, com a indicação do nome da pessoa que oferece o sacrifício, e então talvez seja feito um pedido sob a forma de oração.


Refeição sagrada – no final da cerimónia tem lugar uma naorai – refeição com os Kamis. Todos os presentes recebem do sacerdote uma pequena medida de vinho de arroz.

O culto doméstico


Em quase todos os lares existe um pequeno altar, ou um altar de parede, denominado por Kamidana. Sobre ele encontra-se objectos simbólicos: um amuleto para o Kami, um espelho pequeno, uma vela e um vaso cheio de gravetos de arvore Sakaki.
O ritual inicia-se enxaguando a boca e lavando as mãos. Depois coloca-se um sacrifício em frente do altar, que poderá ser algo tão mundano como alguns grãos de arroz ou uma tigela de água. O suplicante (sentado ou de pé) em cima de uma esteira, com a cabeça inclinada respeitosamente, faz uma pequena oração. Após a oração a cabeça é inclinada por mais duas vezes, as mãos erguidas são também unidas duas vezes, seguindo-se, como conclusão, mais acenos com a cabeça. Quais quer alimentos que tenham sido oferecidos são mais tarde retirados e comidos à mesa.

2 comentários:

  1. Na filosofia xintoísta, nos templos, há somente um pequeno espelho, numa parede, onde a pessoa medita sobre si mesma. Comparado ao oráculo délfico, é como você a descobrir sua natureza divina, conhecendo-se a si mesmo, claro que não só pela aparência física, mas meditando nesse ser que tem vida, mas que é reflexo de tudo o que existe. No fundo mesmo, é tudo questão de humanismo, porque isso sim é que é divino: sua relação simples e direta com a natureza. O resto, é fraqueza, superstição e ignorância, em todos os sentidos.

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